Escadinhas, massa corrida e demais metáforas para relacionamentos
Vai achando que é possível se relacionar sem criar expectativas.
Desde que acordei já vi o post abaixo sendo compartilhado por muita gente, inclusive eu. Estou no aguardo do passo seguinte, que será a problematização do mesmo, argumentando (vou chutar aqui) que tanto o conceito de ficante fixo como a comparação de afetos com exploração da força de trabalho são típicos das relações adoecidas e pautadas pelo capitalismo e a monogamia.
(o post de Instagram do perfil Melted Videos é o print de uma conversa de Whatsapp que diz “ficante fixo é mt pior do que um namoro / é um namoro CNPJ / todo o trabalho, sem os direitos trabalhistas)
Eu sei que quem problematiza não tá mandando nenhuma indireta para mim. Não tô brava não, e nesta maravilhosa redes as pessoas podem escrever palavras palavras palavras sem limite de caracteres até deixar seu ponto claro, sem ambiguidades. Aí que uma coisa puxa a outra e lembrei de ter lido com frequência, tanto em português como em inglês, que “relações não são escadinhas”, e que as decepções amorosas acontecem porque as pessoas criam expectativas de que algo incialmente casual vá, necessariamente, evoluir para outro algo mais estruturado, como uma espécie de prêmio pela dedicação.
(confira nesse outro post da TPM algumas discussões super ponderadas e livres de projeções pessoais)
Sou do tempo em que não existiam palavras em inglês nem português para definir ficante fixo e demais situações por sua natureza indefinidas. Se a gente quisesse ficar várias vezes com o mesmo crush tinha que simplesmente ir nos rolês, torcendo para que ele estivesse lá sozinho e não pegando alguma outra que chegou antes. Caso estivesse sim pegando outra, ou se naquele dia ele estivesse de ovo virado ou com amigos para os quais queria se exibir, ele poderia apenas nos ignorar ao vivaço independentemente de ser ficante fixo, premium ou assinatura paga. Não que isso não aconteça hoje em dia, só que naquele tempo a gente podia até achar ruim, mas achava normal. Então confia, eu não penso que exista um cartão-fidelidade (cartão-monogamia, risos) que obriga alguém a casar comigo após um certo número de momentos íntimos.
Crescer na época em que não tínhamos a internet pra fazer drama e tudo o que sobrava eram pinturas rupestres e chorar no cantinho, forjou caráter e minou a autoestima. Mas, com o tempo, aprendi a identificar situações que não quero voltar a viver.
Acredito que o tempo e a constância, em presença dos tais afetos, deveriam significar alguma coisa numa troca entre seres humanos. Deveriam para mim, porque é o que eu quero das minhas trocas. Não exatamente uma escada que leva até a uma meta mas sim camadas que se solidificam formando uma relação verdadeira (camadas de… massa corrida? cimento? nunca reformei uma casa e dá pra ver). Estou calva de saber que não se podem forçar garantias nesse âmbito da vida e que tudo pode desmoronar de uma hora pra outra, sempre. Mas eu não quero viver nesse niilismo emocional de achar que, já que nada é garantido, então devemos considerar todos os encontros como efêmeros porque apenas aprendizes de trad wife cometem o pecado de ter expectativas. Alguns encontros são efêmeros mesmo, as camadas se desmancham porque não deu liga, em outros as camadas são destinadas a permanecer fininhas sem sustentar nada, leves como teias de aranha e não por isso eles são menos válidos ou prazerosos. Mas eu não tô falando desses casos. Vocês não me façam dar disclaimer de tudo até no Substack.
Inclusive, eu aplico a mesma lógica aos relacionamentos não românticos. Vai achando que é possível manter uma amizade de longo prazo sem nenhum tipo de expectativa sobre a outra pessoa. Expectativa é natural, o lance é aprender a lidar com a possível frustração dela.
Eu talvez seja uma iludida, mas começo minhas relações acreditando que de uma afinidade pode surgir a admiração, da admiração o desejo de proteger o vínculo e de manter o outro por perto, porque esse outro importa. E se algo acontecer para mudar isso, então beleza, se afasta, briga, some, para de falar, para de curtir as fotos, mas assumindo tuas tretas, sem performar “leveza” e “desapego”. Proteger o vínculo significa às vezes tomar decisões difíceis e se colocar em risco. Porque viver as próprias emoções priorizando evitar incomodação não é apenas triste mas ineficaz. Trouble will find you, meu bem.
Para mim, as relações não têm como ser uma estrada reta. A escadinha é inevitável, só muda a altura dos degraus. Só que o Santo Graal no topo dela não é um casamento, mas um lugar onde ninguém tenha medo de assumir seus BOs.
Imagem repetida porque não entendi como fazer aparecer um cabeçalho.
sim!
o que mais me incomoda na não monogamia é a superficialidade. pois leva tempo pra se aprofundar. no outro. e se a pessoa divide seu tempo entre mais de uma, ou se passa tempo procurando outras, simplesmente não sobra tempo pra se aprofundar e daí fica tudo raso demais e que preguiça